sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

“Prendas enchiam três salas”

Jorge Sampaio foi ouvido no âmbito do processo 'Face Oculta' e defendeu o amigo José Penedos.

"As prendas de Natal não cabiam em três salas. Era sempre a mesma coisa, mas, para mim, era absolutamente indiferente quem me estava a dar a prenda. (...) Nunca comprei uma caneta ou um relógio, mas nunca me senti minorado na minha honestidade por causa disso." As declarações são de Jorge Sampaio, ex-Presidente da República, que ontem fez questão de comparecer pessoalmente no Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa para defender o amigo José Penedos. Foi no âmbito do processo ‘Face Oculta' e o ex-governante não se coibiu de explicar que o fez pessoalmente - prescindindo do direito de depor por escrito - porque os papéis são silenciosos. Entendeu que devia comparecer em juízo para explicar o que considerava serem factos - "não sou testemunha abonatória", disse - para ajudar o tribunal a decidir.
"Quando fui eleito Presidente da República, ofereceram-me uma galinha. Esse foi um episódio caricato, mas houve outros", contou Sampaio, que depois recordou ter recebido de tudo. Desde peças de louça de extremo mau gosto, até canetas ou relógios suíços. "Esta caneta que uso foi-me oferecida. Mas não sei dizer quem ma deu."
Os elogios para traçar a personalidade de José Penedos foram muitos. Acusado de três crimes de corrupção e participação económica em negócio, o ex-secretário de Estado foi ontem definido como alguém acima de qualquer suspeita. Sampaio realçou a sua postura moral, a sua inflexibilidade e verticalidade.
Os mesmos adjectivos foram usados por António Vitorino, ex--comissário europeu e socialista, que também considerou José Penedos como alguém impoluto. Sobre as prendas que o mesmo terá recebido de Manuel Godinho - o sucateiro que está em prisão preventiva -, António Vitorino também falou em termos genéricos. Explicou que só foi governante "dois Natais" e que a sua experiência era curta. Mas garantiu que as prendas nunca eram devolvidas, sob pena de o facto ser entendido como uma falta de cortesia.
Já na Comissão Europeia, Vitorino diz que foram estabelecidos limites para as prendas. Mas por imposição dos países Nórdicos, que consideravam de mau tom receber presentes.
Sobre as ofertas, o Ministério Público não interrogou as testemunhas. O juiz também nada perguntou. 

EDUARDO CATROGA E ÂNGELO CORREIA EM TRIBUNAL

José Penedos terá ao seu lado um desfile de famosos. Depois de Jorge Sampaio e António Vitorino é a vez, amanhã, de Eduardo Catroga e Ângelo Correia comparecerem no Tribunal Central de Instrução Criminal. Ambos deverão ser confrontados com a oferta de prendas e também com o perfil de Paulo Penedos. A defesa pretende demonstrar em primeira linha que eram normais as ofertas aos membros do Governo e, depois, que se o filho de Penedos alguma vez sugeriu que o pai poderia ajudar o sucateiro era por "vaidade". O MP disse que o sucateiro era mesquinho ao acusar o filho de mentir.
 
'CM' OPÕE-SE À DESTRUIÇÃO

O CM constituiu-se assistente no processo ‘Face Oculta' e opôs-se também à destruição das escutas telefónicas envolvendo José Sócrates. Está em causa o direito de defesa do jornal, na sequência de uma série de processos de difamação interpostos por alguns dos intervenientes. O juiz ainda não se pronunciou.
 
CRIMES COMETIDOS NO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES

Ricardo Sá Fernandes, advogado de Paulo Penedos, já interpôs recurso à destruição das novas escutas detectadas no ‘Face Oculta' e que envolvem o primeiro-ministro, José Sócrates.
Numa longa exposição, o causídico - que defende o advogado de Coimbra - volta a alegar que é nula a decisão do presidente do Supremo de anular e mandar destruir escutas telefónicas de conversas realizadas entre o primeiro-ministro e um suspeito. Explica que eram conversas em que se indiciava "acidental e fortuitamente a prática de crimes cometidos pelo primeiro-ministro no exercício de funções, como, por exemplo, o alegado crime de atentado contra o Estado de Direito", não tendo, por isso, Noronha do Nascimento competência para anular a decisão do juiz de Aveiro.
Garante Sá Fernandes que Noronha só podia ser chamado a validar escutas se os crimes fossem cometidos fora do exercício de funções. "Acresce que a competência do Supremo não cobre, nem tinha de cobrir, os casos em que o primeiro-ministro não é sequer suspeito da prática de qualquer crime e mantém conversas telefónicas com um suspeito", explica, dizendo depois que, se assim fosse, o "juiz teria de adivinhar quem são os interlocutores com quem o suspeito iria falar". 


Já não há moralidade, temos então que um antigo Presidente da República, que ocupou o cargo simbolicamente mais importante do Estado, se gaba de durante o seu mandato ter recebido "prendas de Natal" que "não cabiam em três salas". E acrescenta que "nunca comprei uma caneta ou um relógio mas nunca me senti minorado na minha honestidade por causa disso". E exemplifica dizendo: "Esta caneta que uso foi-me oferecida. Mas não sei dizer quem ma deu". Terá Jorge Sampaio consciência do efeito público que estas suas declarações provocam? É manifesto que o recebimento de prendas não diminui a honestidade de ninguém e sabemos todos que o Presidente Sampaio nunca alteraria as suas decisões em função das prendas que recebeu. Não é isso o que está em causa. O que está em causa é a imagem pública que este tipo de notícias produz nos cidadãos em relação à actividade política, e pela qual um Presidente da República deve ser o primeiro a zelar. O que eu gostaria de ter ouvido um antigo Presidente da República dizer era: "Posso ter ofendido imensa gente durante o meu mandato, mas garanto que todas as prendas que me enviaram foram devolvidas pelos serviços da Presidência. E só uso canetas compradas por mim ou oferecidas pelos meus familiares e amigos". E acho que é isto o que os cidadãos têm o direito de esperar do mais alto magistrado da Nação.

1 comentário:

  1. presentes bonitos realmente agradável graças compartilhamento de informar-me ..

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