sexta-feira, 1 de abril de 2011

A loucura a que este pais Chegou...

 Se bem percebo o país desatou a rir porque Paulo Futre anunciou que o futuro do Sporting passa por um jogador chinês. Vi o vídeo em questão e não percebo o que causou tal galhofa. Em primeiro lugar porque aos olhos de quem está de fora da mística e de tudo o mais que caracteriza os adeptos do futebol, as declarações de Paulo Futre em nada destoam daquilo que todos os dias outros dirigentes, candidatos a tal e a massa associativa (adoro esta expressão!) dizem a propósito dos mais variados assuntos. Por estranho que pareça, pelo menos aos ignorantes em matérias de esférico, como é o meu caso, os mais comedidos e razoáveis diante dos microfones parecem ser os jogadores.

Em segundo lugar também me causou perplexidade que não se entendesse a relevância do “tal jogador fantástico” chinês. Afinal não é de modo algum inédita a contratação de determinados jogadores por causa da sua nacionalidade ou pela especial ligação que mantêm a determinados regimes, sobretudo aqueles cujas contas públicas não são escrutinadas para não dar má imagem dos seus políticos. Ou será que Al-Saadi Kadafhi, filho do ditador líbio, envergou a camisola do Perugia, do Udinese e do Sampdoria por causa dos seus dotes enquanto jogador? Se os chineses estiverem dispostos a encher aviões de adeptos para verem o “tal jogador fantástico” chinês de que fala Paulo Futre não me parece que fosse mau negócio contratar o dito chinês que certamente não faria pior figura que Al-Saadi Kadafhi no campeonato italiano.

Mas o que mais me surpreende na reacção galhofeira à intervenção de Paulo Futre é o facto de se ter considerado delirante a antevisão de Futre de centenas de chineses a desembarcarem semanalmente na Portela donde rumariam a Alvalade, enquanto o Sporting cobraria comissões às companhias de aviação, aos hotéis, aos restaurantes, aos museus… frequentados pelos ditos chineses. Vão desculpar-me mas estão a rir-se de quê? Já se esqueceram das figuras patéticas observadas neste país aquando da visita a Portugal do presidente chinês em Novembro do ano passado? Os jornais de referência encheram-se então de títulos que em nada divergem dos arrebatamentos de Paulo Futre com o departamento chinês do Sporting: Homem mais poderoso do mundo em Lisboa para comprar dívida”; Hu Jintao está em Portugal para comprar a dívida”; “Presidente chinês garante: “O futuro é promissor“…E agora que Lula veio a Portugal os títulos gloriosos voltaram a sair da gaveta, só que onde em Novembro passado se lia China lê-se agora Brasil.

Confesso que sinto uma vergonha profunda durante aquelas horas em que só se fala do presidente do país mais poderoso do mundo, do governante da nação mais rica do planeta ou do líder do país mais irmão que vão resolver a nossa crise. Peço aos céus que ninguém naquelas comitivas veja a televisão portuguesa, ouça os noticiários das nossas rádios ou passe os olhos pela nossa imprensa pois de tudo aquilo emana um misto de sabujice, própria de quem está desesperado, e de chico-espertismo característico de quem viveu acima das suas possibilidades e agora espera sacar uns trocos a uns dirigentes que na verdade considera uns novos-ricos.

Poucas horas depois deste deprimente exercício, o presidente do país mais poderoso do mundo, o governante da nação mais rica do planeta e o líder do país mais irmão, partem com um ar que me parece ligeiramente escarninho e declarando que sim, que vão tomar em consideração o nosso caso. Estes visitantes não resolvem os nossos problemas mas poupam-nos o exercício de nos confrontarmos com os nossos erros e sobretudo fazem-nos companhia nas horas do medo. Por causa desse pavor ao momento em que nos veremos ao espelho, mal eles partem pegamos na fanfarra da GNR e nas borlas e capelos dos doutoramentos honoris causa até que outro presidente do país mais poderoso do mundo, governante da nação mais rica do planeta ou líder do país mais irmão aterre na Portela e o circo possa recomeçar.
Ao pé destes arrebatamentos com os salvadores da nossa ruína, arrebatamentos estes que foram precedidos e induzidos pelos arrebatamentos em torno dos modelos da riqueza – uns dias era finlandês, outros “escandinavo renovado” e outros ainda do MIT – as antevisões de Paulo Futre parecem-me um exemplo de equilíbrio e sensatez.

O triste sintoma do estado de alienação a que chegámos é que o país desata a rir perante a descrição dos chineses salvando o Sporting e já não reage perante o espectáculo do presidente do país mais poderoso do mundo, do governante da nação mais rica do planeta e do líder do país mais irmão que, agora sim, desta vez é que vai ser resolverão o problema da nossa dívida

In: PÚBLICO Via Blasfémias

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